(Haikai no Renga)
Não há primavera
Na nebulosa de Órion
Mas, quem sabe, um dia…
O tempo não corre
Na nebulosa de Órion –
Quem conta seus dias?
Há um coração
Na nebulosa de Órion
Que é ela inteirinha
Há um véu de noiva
Na nebulosa de Órion
Bodas nas estrelas
Escapam de dentro
Da Nebulosa de Órion
Dez mil vagalumes
A corte Heian –
ó, Nebulosa de Órion! –
perdoará Genji?
Dez mil vagalumes
libertados pelo príncipe
luziram seu ombro
Aquele ombro nu
brilhou mais que o cinturão
de estrelas de Órion
Vagas como estrelas,
damas da corte Heian
recolhem seus leques.
Vagos são os lumes
nos aposentos Heian –
Vagos são seus lumes
caio leonardo
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Clicando aqui você verá novas imagens da Nebulosa de Órion que foram divulgadas hoje, 16.1.2018, pelo Le Monde. Tive o impulso de sempre: compor um haikai – mas logo pensei que não há estações do ano na Nebulosa de Órion… Dessa constatação discutível, surgiu teimoso um primeiro haikai-sem-kigo, e esse haikai torto pediu outro que retratasse o enorme coração que parece ser a nebulosa, depois ainda outro que falasse de como tudo nela é delicado, diáfano, transparente, então foi que surgiu a imagem de estrelas brotando da nebulosa e elas me lembraram os vagalumes com que o príncipe Genji iluminou o aposento onde seu primo desnudava o ombro de uma dama da corte do período Heian, célebre cena escandalosa dos Contos de Genji, um haikai puxando outro, e me vi compondo um “haikai no renga”, um terceto encadeado no outro, algo que a tradição manda que seja uma obra coletiva, assim iam longe noite adentro os poetas no Japão feudal, uma longa jornada noite adentro, sem rumo nem destino.
Esta jornada começou em Brasília, passou por Paris, caiu na Nebulosa de Órion, que se tornou vagalumes num aposento no Japão do século XI… Você devia compor o próximo. Vem. Vamos.