Dia do Pi, a celebração da Ordem no Caos

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Eu também vou celebrar hoje o Dia do Pi. Farei um brinde às 9h26’53” – da noite, claro, que hoje é sábado.

Todo ano tem Dia do Pi, um Pi de até 4 decimais (3,1415). Mas o Dia do Pi deste ano é histórico, porque ocorre apenas a cada cem anos. Nele, teremos um instante com um Pi com 10 decimais: 3,141592653, donde o meu brinde. Só o viverei uma vez (em 2115, teria 151 anos – que preguiça)

Este artigo da New Yorker chama a atenção para, entre tantos outros, este aspecto do Pi: ele é ordem no caos. É uma razão infinita, que nunca encontra padrão de repetição; infinita, mas derivada (historicamente) da realidade lógica da geometria do círculo.

Digo historicamente, porque o Pi foi primeiro descoberto “dentro do círculo”. Mas ele está no espaço e também está no tempo, como se viu depois. Está no espaço geométricamente considerado; e está no tempo na dimensão dos ciclos. O círculo revela o Pi no espaço; ciclos revelam o Pi no tempo. O Pi está no ciclo da nossa respiração, lembra o artigo de Steven Strogatz.

Este Dia do Pi, no Brasil, cai entre uma sexta e um domingo em que nossa respiração está fora de ciclo, curta, entrecortada, o caos bate à porta, toma o espaço das ruas e define este nosso tempo.

Farei um brinde esta noite ao Pi, guardião de círculos e ciclos, senhor do Tempo e do Espaço. Que inspirado nele, ou ignorando-o completamente (como o fazemos ao respirar), encontremos Ordem no Caos.

Caio Leonardo

Arte: Cristian Iles Vasile

Março de 2015 ou Notas sobre a Volatilidade da Nitroglicerina

Em novembro, 3 legendas disputavam protagonismo político no Brasil: PSB, PSDB e PT. Hoje, esse tal protagonismo é monopolizado por uma única legenda: PMDB.

O PSDB mergulhou na inação que lhe é peculiar. Dois ex-candidatos da legenda à presidência da República ocupam assentos (modo de dizer) no Senado. E não usam da palavra, não esclarecem sua posição, não apontam um caminho. Serra e Aécio não mostram a que vieram. Cássio Cunha Lima foi o primeiro a usar o termo impeachment fora e dentro do Parlamento. Aloyzio Nunes declara que quer ver Dilma sangrar. Nada nessas posturas indica compromisso com o País. Nem mesmo com uma incipiente que seja, inarticulada que seja estratégia de tomada de poder.

O PSB, que quase tomou o lugar do PSDB no 2º turno das eleições presidenciais em 2014, recolheu-se a uma insignificância, mal se ouvem seus sinais vitais.

O PT não se entende com o Planalto – mas nisso está alinhado com todo o País. E tampouco entende-se consigo mesmo. As duas faces de Janos que o caracteriza se bicam todo o tempo: a que articulou o projeto de poder tendo como princípio a legalidade revolucionária (vale tudo pela causa) e a que pregava a ética na política. Uma está encarcerando a outra.

No vácuo impossível de poder, surge devastador e onipresente o PMDB, que tem a presidência do Senado, a da Câmara – e, lá, a presidência da CPI que catalisa as atenções da Nação – e a Chefia de Estado. Sim, a função de Chefe de Estado – que é, internamente, a de compor um governo, uma base de sustentação política – é exercido também pelo PMDB, na pessoa do Vice-Presidente da República.

O PMDB, hoje, não é Oposição, nem apoia a Situação. Hoje, o PMDB – e o PMDB de Eduardo Cunha – é o que mais próximo de Governo o Brasil tem. É a vontade dele – a agenda dele – que prevalece.

O Brasil vive uma crise política, com um Executivo que não governa. E uma crise social, com uma tensão a ser liberada nos Idos de Março.

A incapacidade da Chefe de Governo comunicar-se com o Parlamento e com a população criou a tensão política e social. A economia dá sinais de fadiga devido a vários fatores, que convergem para – e se agravam com – a sua má condução pela Presidente da República.

Se temos um Executivo apoplético, o Senado assiste constrangido a um presidente que perdeu o controle sobre suas circunstâncias e não pensa mais politicamente. Apenas atira para todo lado.

Em meio a tudo isso, temos o que era impensável para um analista até setembro de 2014: uma Câmara dos Deputados protagonista.

A presidente está ilhada e refém de apetites vorazes, mas o Congresso também segue atenazado por uma investigação sem fim nem paradeiro. A maior empresa do País agoniza.

Nesse quadro de instabilidade econômica, política e social, duas manifestações de cores opostas são convocadas para a mesma semana. A primeira, convocada para contrastar a segunda. Nada de bom surgirá destes Idos de Março.

Ainda na vertente de emparedamento do Executivo, Mercadante passou o dia de hoje (11 de março) no foco dos boatos de fritura. Enquanto isso, em paralelo, o Planalto começou, muito tardiamente, a enviar novos emissários políticos para construir pontes e apaziguar o quadro. Os interlocutores políticos mudaram – embora não oficialmente. Temer volta ao núcleo duro. Kassab, Aldo Rebelo e Eliseu Padilha, homem de Temer, são os novos nomes. São sinais ao centro, à direita e à esquerda. São ministros visitando o Congresso e suas bases.

Que não seja tarde demais. Porque o Brasil não pode se permitir retrocessos, nem rupturas que em nada servirão a seu povo, mas tão somente a apetites descompromissados com o País e a ânimos sinceramente exaltados de lado a lado – todos cobertos de razão, mas a um passo de perdê-la.

Um Caminho para o Brasil

Hoje é 9 de março de 2015, e o Governo perdeu o contato com os cidadãos, com o Parlamento e não consegue apresentar uma narrativa consistente sobre a realidade que estamos vivendo no Brasil.

Essa narrativa não tem como ser construída numa Torre de Marfim. É preciso que o Governo faça sua autocrítica e dialogue com seus críticos. Mais do que isso: é preciso que o Governo dialogue na construção de cenários e de soluções com aqueles que serão impactados, positiva ou negativamente, pelas medidas que serão tomadas.

O Governo precisa voltar a se comunicar com os cidadãos, com trabalhadores, com empresários e com o Parlamento.

Faltam pontes – pontes políticas. O Governo precisa ir ao Parlamento ANTES de tomar medidas – e ouvi-lo; precisa ir ao setor privado, com transparência – e ouvi-lo; precisa ouvir as divergentes vozes que falam pelos trabalhadores. Uma vez construída uma solução, o Governo precisa explicar as medidas aos cidadãos, explicar onde estamos e para onde se está querendo ir.

É preciso que o Governo faça uma autocrítica em público e de público. Que assuma ter andado mal aqui e ali, e que pretende consertar com isto e aquilo – ouvindo a todos os implicados.

O Brasil precisa de uma narrativa que o explique. E de líderes que construam uma narrativa que faça sentido para todos. Não se trata de criar consenso ou pensamento único, mas sim de todos concordarem que o vestido é azul e preto, ou branco e dourado, dependendo da luz. Hoje, ninguém concorda sequer que se trata de um vestido. É preciso deixar claro, enfim, qual é a situação atual da economia e das contas públicas. É preciso deixar claro aonde se quer levar o País. No que vamos investir. No que será preciso cortar investimentos – e por quê.

O Brasil só sairá desta crise com Comunicação e Pontes, feitas a partir de Autocrítica e por meio de Diálogo e Construção Conjunta de Soluções.

O isolamento atual do Palácio do Planalto só tem efeitos deletérios sobre tudo o que se construiu – e foi muito o que construímos! – desde 1988.

Sobre Panelas, Janelas, Ruas e Caminhos

As panelas e os gritos são legítimas expressões de uma visão do quadro geral brasileiro. Não é a única, nem a majoritária, mas é legítima. Ninguém pode ser obrigado a concordar com qualquer governo.

As panelas e os gritos não são as únicas expressões legítimas de visão do quadro geral brasileiro. Há outras, majoritárias ou não, igualmente legítimas.
Ninguém pode ser obrigado a concordar com quem faz barulho, apenas por que o fazem.

A única expressão ilegítima é aquela que prega solução não institucional para uma crise (séria) de governabilidade.

O Governo Dilma não conseguiu formar maioria no Parlamento. Isto é grave. Se estivéssemos em regime parlamentarista, novas eleições estariam sendo convocadas pelo Chefe do Estado. Mas nosso regime é presidencialista. Nele, o mandato do Chefe de Estado e de Governo, ambos encarnados na mesma pessoa do Presidente da República, não pode ser encurtado, a não ser por licença (um encurtamento branco), renúncia, impugnação de mandato, impeachment ou falecimento.

A saúde da nossa presidente vai bem – e não há nada que a convença a passar quatro anos sabáticos na Universidade de Pequim -, então licença, por ora, está descartada. E seu falecimento, também, mas a vida é frágil. A vida sob pressão, fragilíssima.

Renúncia está descartada. Ela mesma disse que não renuncia, nem se mata – não teremos um segundo Getúlio. No entanto, se Dilma renunciasse, assumiria Michel Temer até 31.12.2018.

A ação de impugnação de mandato só poderia ter sido movida até 15 dias da diplomação. Estamos a meses dela. Precluiu. Mas dependeria de prova de abuso de poder econômico, corrupção ou fraude. Se tivesse sido movida e a ela dado provimento, Dilma e Temer cairiam, e teriam lugar novas eleições – das quais, é sempre bom lembrar, Lula poderia participar como candidato.

Não há base para impeachment: crime comissivo previsto na Lei de Crimes de Responsabilidade (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l1079.htm). Não há impeachment por incompetência, inépcia, imperícia ou omissão (no Parlamentarismo, na prática, há). A CPI da Petrobras tem o firme intento de encontrar ligação da presidente com algum crime. Se um crime vier a ser imputável a ela, poderemos assistir a um processo de impeachment.

Na hipótese ainda remota de impeachment, é bom esclarecer que quem assume, de novo, é Michel Temer.

Toda alternativa fora das hipóteses acima implica ruptura da ordem constitutional. É golpe. Não há legitimidade em golpe dado numa democracia – e vivemos numa, com as instituições funcionando tanto que vemos escândalos todo dia, escândalos dos quais nada se saberia, se não estivéssemos, bem, numa democracia, com as instituições funcionando. É assim o círculo virtuoso de uma República onde o Estado de Direito funciona.

Gente graúda está na cadeia. Gente graúda está sendo investigada. Sem democracia, nada disso estaria acontecendo – e nada disso aconteceu antes de alcançarmos o atual estágio de maturidade das instituições, um estágio que se perderia com a regressão a um regime sustentado por um golpe.

Não, não existe “intervenção militar constitucional”. O art. 142 da Constituição Federal autoriza o Presidente da República, o Presidente do Congresso, o Presidente da Câmara, o Presidente do Senado ou o Presidente do Supremo Tribunal Federal a solicitar ação das Forças Armadas para garantir a lei e a ordem. Alguém aí quer Dilma, Eduardo Cunha, Renan Calheiros ou Lewandowski chamando o Exército para impor a lei e a ordem? Para, por exemplo, impedir manifestações?

Os líderes políticos brasileiros estão sob sério questionamento. E não estão respondendo à altura do momento histórico. Alguém precisa pensar saídas institucionais com grandeza e firmeza de propósito.

E esse alguém é Você e sou eu e somos todos nós. Não dá para delegar, nem para agir como manada, como uma maria-vai-com-as-outras num tema tão sensível como o do futuro deste País, que está, sim, sob risco.

Hora de sermos responsáveis e de nos colocarmos à altura do que a História exige de nós. E esse “nós” somos, repito, Você e eu e todos e cada um dos que vivem neste e deste País